Speak, but do not separate No from Yes
Paul Celan
*
saturn
abrupt
sonorous honey
avid gold. i see
the astral hands shaping
the river courses
and drawing the shadowed sphere
around the eye
and
i feel the quivering gold of the lip
the (whole) earth so
tangential to the miracle
bread justly
just leavened
and the ash ring in the finger’s absence
and in the womb the stone of a name
wrapped up in satin
*
i am the colour of a safire above the movement
pierced by wires
when you call my name
i am saturn in hermes, and
domes of sound, and (i see)
my children’s faces outlined on dust
nourished on the briefest light spasms
(and, i see how) memory
is here the opposite of light
stuff of warm amphorae
contained in a bell jar of roses
in a womb-like penumbra
here
*
only i see hermes jumping garden fences
recoiling from torment and pain
carrying on his chest a basalt saturn
and, i remember
always like scent
or agro-hunger,
myths
names arrive afterwards
at the poem
over walls slanted by thirst
bright lit indigo eyes
and on the sand (the) houses modelled
between shade and sea
by the months’ deep red sweat
i see how the names: stars, afterwards
overflow from the earth
as if having found the hands’
empire map
and, how in the skies of your heart,
roots are decanted
from stones, as if
that death were the map
and we were reborn from the fingers’ minerals.
Alive,
*
and, i see the sky
and feel all fruits, all names on the
inside
i know it all
by astro-heart, lyre and song
i know the eyes the houses and vexation and ecstasy
of water and lymph poured out on the loins
while on the steppe of the earth
the stars hear the chords
of battling bodies
i know the name of the face and the place
and (whether)all the last eyes of the dead are mine
*
i know
the hour is hasty, if
the distended mouth
is encircled by honey
in the tardiness of the horoscopes
i look in the eyes
from mercury
to mars the dagger the skin, the succinct chisel
of an instant
*
and finally as if it were amber
shaped by eyes
between copper thresholds the artisan
in my name sails the salt
the living basalt of the hands
the whole skin the whole lymph as a bell jar of thirst
*
and, without names, only as a balancing island, i see
the emerald coloured fan
sowing
sepal ash blood with honey and fright
(all around the orchards)
and within all the emotion of names
the landscapes
mouths
houses made
of living basalt, i see
*
(i see) the earth like a shoulder high thirst,
and while the father breaks bread,
the names come
as if
they were arcades buried underneath gentleness
and an instant
names spinned by spindle and lyre
pierced by the synovial artery of sound
time name thing between
skin and pore bread and fire star and house, it is
*
it is long the journey between
echo and heart
and the head
still in clay, if
the garden is trespassed by the sea:
eyes between volcano and moon
nothing is as light as honey, or snow, and
blood is also something
erect
round the waist it holds the names, and the mercury of the eyes, and
*
the names, shadow of a shadow under
the shade, unmemorable basalt
every name is unmemorable
always another shadow
and then the encrusted images
are a woe
on the bed of dust
i now greet the bird
the budding stem at the foot of boats
i now greet the flashing
hand between temple and clay
and
between sphinx and idea
the blindness of movement,
(and) the names:
© Translated by Ana Hudson, 2011
saturno em hermes
Fala, mas não separes o Não do Sim
Paul Celan
*
saturno
abrupto
mel sonoro
ouro ávido. eu vejo
as mãos astrais modelando
o curso dos rios
e desenhando a esfera de sombra
em torno do olho
e
sinto o fremente ouro do lábio
a terra (toda) tão
à tangente do milagre
o pão justamente
acabado de fermentar
e o anel de cinza na ausência do dedo
e no ventre a pedra de um nome
envolta em cetim
*
sou cor de safira por cima do movimento
atravessado por arames
quando me chamas pelo nome
sou saturno em hermes, e
as cúpulas do som, e (vejo)
o rosto dos filhos desenhados no pó
nutridos a brevíssimos espasmos de luz
(e, vejo como) aqui
a memória é o oposto da luz
coisa de ânforas quentes
enformadas em redoma de rosas
e penumbra de ventre
aqui
*
só eu vejo hermes pulando quintais
passando ao largo de tormento e odor
ao peito leva saturno em basalto
e, lembro-me
é sempre como se fossem perfume
ou fome agrária,
de mitos
que os nomes chegam depois
ao poema
sobre muros inclinados na sede
o índigo dos olhos acesos,
e na areia (as) casas modeladas
entre sombra e mar
pelo rubro suor dos meses
vejo como os nomes: astros, depois
transbordam da terra
como se encontrassem o mapa
do império das mãos
e, como no céu do teu coração,
se decantam as raízes
das pedras, como se
essa morte fosse o mapa
e nós renascêssemos nos minerais dos dedos.
Vivos,
*
e, eu vejo o céu
e sinto todos os frutos, os nomes todos
por dentro
sei tudo
por astro-lábio lira e canção
sei os olhos as casas e o vexame e o êxtase
da água e da linfa aberta pelos quadris
enquanto na estepe da terra
as estrelas ouvem os acordes
dos corpos nas batalhas
sei o nome do rosto e do lugar
e (se) são meus os últimos olhos de todos os mortos
*
sei que
a hora é célere, se
rodeada
de mel a boca distendida
na lentidão dos horóscopos
olho os olhos
de mercúrio
a marte a adaga a pele, o cinzel sucinto
de um instante
*
e por fim como se fosse âmbar
modelado por olhos
entre umbrais de cobre em meu nome
o artesão navega o sal
o basalto vivo das mãos
a pele toda a linfa como redoma da sede
*
e, sem nomes, só ilha no movimento, eu vejo
o leque cor de esmeralda
semeando
sépala cinza sangue a mel e susto
(em redor dos pomares)
e, dentro de toda a comoção dos nomes
as paisagens
bocas
casas feitas
de basalto vivo, vejo
*
(vejo) a terra como uma sede à altura dos ombros,
e enquanto o pai parte o pão,
os nomes vêm
como se
arcadas sepultadas sob a doçura
e o instante
modelados a fuso e lira
atravessados pela artéria sinovial do som
tempo nome coisa entre
pele e poro pão e lume astro e casa, é
*
é longa a viagem entre
eco e coração
e de argila ainda a
a cabeça, se
o jardim atravessado pelo mar:
os olhos entre vulcão e lua
nada é leve como o mel, ou a neve, e
também o sangue é uma coisa
a prumo
à cintura leva os nomes, e o mercúrio dos olhos, e
*
os nomes, sombra de uma sombra sob
outra sombra, basalto imemorável
todo o nome é imemorável
sempre outra sombra
e são depois um luto as imagens
incrustadas
no leito do pó
saúdo agora a ave
a estaca em flor no sopé dos barcos
saúdo agora a mão
relâmpago entre têmpora e barro
e
entre esfinge e ideia
a cegueira do movimento,
(e) os nomes:
in Cràse nº1 (literary magazine)