there are only two or three ways
of knowing you; this is the one that takes longer.
the rain has stopped and, distracted, we continue
this coast-hugging love, never too
far never too near the flesh, the organs
protected by a vault of bones. we fulfil
the liturgy of the hours, repeated without conviction
or effectiveness, and at times words start
to make sense, as do my gestures
pulling you towards me with one single hand
and some sleepiness. a slow navigation,
familiar and comfortable, because
this is the best way to know your
fingers and how you use them
to plait the hours, as if
weaving hair or fraying silent rosaries,
just the technique of rolling
beads and mysteries into your hand
to entertain the suitors and
await my arrival from the long
journeys I undertake
– ten years at a time – without leaving home.
today I’ve been to Lisbon and I brought you red
apples from the Lusíadas street grocer,
with which I intend to put you to sleep (as
in the tale we tell every night), because
this is the only way to know your
fears and interpret your dreams, to write,
next to you while you sleep, the lists
of daily tasks we perform
to kill time.

© Translated by Ana Hudson, 2011

 

(SJ-06)

as formas de conhecer-te são só duas
ou três; esta é a que demora mais tempo.
a chuva parou e continuamos distraídos neste
amor de cabotagem, nunca demasiado
longe ou perto da carne e dos órgãos que uma
abóbada de ossos protege. cumprimos
a liturgia das horas, repetida sem convicção ou
eficácia, e por vezes as palavras começam
a fazer sentido, como os gestos com que
te aproximo de mim, com uma só mão
e algum sono. uma navegação lenta,
familiar e confortável, porque
essa é a melhor forma de te conhecer
os dedos e o modo como os usas
para fazer tranças às horas, como quem
tece cabelos ou desfia um rosário
sem murmúrios, apenas a técnica de rodar
terços e mistérios no fundo da mão
para entreter os pretendentes e
esperar que eu regresse das longas
viagens – dez anos de cada vez –
em que me ausento sem sair de casa.
esta tarde estive em Lisboa e trago-te maçãs
vermelhas de uma mercearia da rua dos Lusíadas,
com as quais tenciono adormecer-te (como
na história que contamos todas as noites), porque
é essa a única forma de te conhecer
os medos e interpretar os sonhos, escrever
ao teu lado, enquanto dormes, a lista
das tarefas diárias com que nos ocupamos a
matar o tempo.

in Criatura nº5, 2010