And again this sky unfolds its autumn
matter. With the precision of a vintager, I grasp
the vine branches and cut bunches of mist pouring
over the earth. I load them on to the poem’s wagon
and drive them to the abandoned cellar of dreams
to turn them into a wine of words
made from the most liquid syllables, those which
can be drunk from the cup of the stanza. A smoke
of ancient inspiration rises from the vat
of mysteries. Barefooted girls wearing
aprons of sun climb on to the press
and tread the grapes. Juicy smells reach
their heads, and before they get too
tipsy they tell of perishable memories
born from nocturnal escapades
through unpunished fields of summer. I wait
for their work to be done and watch them leave,
their legs purple to the knee, their skirts lifted
to the thigh. Their eyes whirl like
wind-inebriated sails; and they open
their arms to the light, wanting it
to rid their bodies of clinging foam.
And I sing those bodies, as
if they had asked me to transform
the must of their lips into the pure red
of dawn. Thus, a wave of lines
uttered during the rituals of origin spreads over
their breasts, bestowing primeval whiteness,
and making me drink the liquid
distilled by their feet. I can only beg them,
as they dress in their gowns of cloud,
to go again through the severed vines
and embrace the vintagers, kissing them,
so they may taste the new wine on their lips.
© Translated by Ana Hudson, 2015
A vindima de Eros
E de novo este céu desenrola a sua matéria
de outono. Com a precisão do vindimador, agarro
as suas vides e corto os cachos de névoa que
caem sobre a terra. Ponho-os no carro do poema,
e levo-os para a adega abandonada do sonho
para os transformar num vinho de palavras
feitas com as sílabas mais líquidas, as que se
podem beber pela taça da estrofe. E um fumo
da antiga inspiração evola-se da cuba
dos mistérios. As raparigas descalças, com
os seus aventais de sol, sobem para o lagar
e pisam as uvas. O cheiro do sumo sobe
até ao fundo da sua cabeça, e antes que fiquem
tontas começam a contar as memórias perecíveis,
as que nasceram de uma fuga nocturna
pelos campos impunes do estio. Espero
que acabem o seu trabalho, e vejo-as sair com
as pernas roxas até aos joelhos, e as saias subidas
até às coxas. Os seus olhos rodam como
as velas de um moinho ébrio de vento; e
abrem os braços à luz, como se desejassem
que ela limpasse os seus corpos da espuma
que os envolve. E canto esses corpos, como
se elas me pedissem que transformasse
o mosto dos seus lábios no vermelho puro
da madrugada. Assim, uma levada de versos
recitados nos rituais da origem inunda
os seus seios e restitui-lhes a brancura inicial,
enquanto me obrigam a beber os líquidos
que os seus pés destilaram. E apenas lhes peço,
quando vestem as suas túnicas de nuvem,
que atravessem de novo as videiras decepadas
e abracem os vindimadores, beijando-os,
para que eles provem o vinho novo dos seus lábios.
in A Convergência dos Ventos, 2015