Re-learn the world
anew:
brief burst of sun revealed
in a swan,
a mermaid harmonising the universe
Only the wind succumbs
to the excess of light,
and only the wind,
a lute in blue,
slowly repeats the same sound:
It doesn’t matter where I am
I don’t need a traveller’s
map
Your fingers marked
the subtlest route over my body
and their timeless
topographic curve
stayed there, like a smile, or the mouth
of a nameless river
It doesn’t matter where I am:
this line of firs or pine trees
sloping softly,
lightly, towards the sea,
can be everything
It can even bring the swan
from the line above
and place it here, on this one,
now,
or disorganise one third
of the mermaid and turn her
into an island infused
with whatever peace
It doesn’t matter where
I am
They say the Greeks
knew five ways to talk
of love.
We only know one, which cannot contain
the near paradox
of love being all we know of love
and nothing else
It would be good to have, in the verse,
all those ways, all those words
close at hand: a brief dictionary
that might know all inner
landscapes
Not to resist time
I don’t know if the Greeks had several
ways to talk of death,
or even if love
has borrowed some of those ways
for its self-definition
There is literature that speaks of what is
upstream from love,
but it’s not – eros, thanatos,
their connection, their being-between-
being
But all that is known
is repeated in the path of the mermaid,
her enigma
transfigured into the swan
They say the swan only sings
when it’s dying.
But we need to organise the wind
so as to paint its speed
in a deeper blue
I ask the wind for a sound
an image
as bright and dazzled
as the ones I have
in front of me
No answer from the wind though,
implausible that it should speak
The route you marked remains,
however, and my body
recognises the touch
of your fingers
Where is that which is depicted
in verse,
in the midst of all this?
Where are all the words
hiding?
I know I need a new way,
a new word
for the frame, or the colour
learning through
seeing is
what I’m missing now
– only the sun is left,
shedding light on the very spot
where a traveller’s map is useless
All else: invented
more than three thousand years
ago, among temples and stairways where
disobedient disciples sat
I resort to the lute,
– but only the verse speaks,
answering me
Rhyming lines, fiery
circles, fragments inundating
already written words
I stamp this sea, on all of them
and dream these are the words.
In the morning of this sun,
I see them thus,
knowing them for the time they hold,
almost sacred temples where I paint
the day in colours,
inherited from a thousand generations
In tradition of no travel,
they are the only
point of resistance
Everything else: an invention,
moulded and remoulded,
centuries multiplied a hundred
times
More than four thousand years
into this new era,
and nothing is new under
this sun
Perhaps only this
abyss.
On the map, do I disrupt
the precipice?
The trace of your fingers,
a route that nearly harbours mermaid,
lute, time,
on this route
– I suspend it
© Translated by Ana Hudson, 2009
Topografias em quase dicionário
Reaprender o mundo
em prisma novo:
pequena bátega de sol a resolver-se
em cisne,
sereia harmonizando o universo
Só o vento sucumbe
à demais luz,
e só o vento,
como alaúde azul,
repete devagar os mesmos sons:
Não interessa onde estou,
não me faz falta um mapa
de viagem
Os teus dedos traçaram
ligeiríssima rota no meu corpo
e a curva topográfica
sem tempo
aí ficou, como sorriso, ou foz
de um rio sem nome
Não interessa onde estou:
esta linha de abetos ou pinheiros
que em declive se estende, branda,
leve, e se debruça em mar,
pode ser tudo
Pode mesmo ir buscar o cisne
ao verso acima
e colocá-lo aqui, sobre este verso,
agora,
ou desorganizar um terço
da sereia e transformá-la
em ilha resumida
de uma paz qualquer
Não interessa onde
estou
Diz-se que os gregos
tinham cinco formas para falar
de amor.
Nós temos uma só, onde não cabe
o quase paradoxo
de que amor é tudo o que dele sabemos.
Nada mais
Era bom ter no verso
as formas todas, essas palavras todas
sempre à mão: pequeno dicionário
que soubesse de paisagens
de dentro
Não resistir ao tempo
Não sei se os gregos tinham várias
formas para falar da morte,
nem mesmo sei se o amor
foi buscar alguma dessas formas
para se definir
Há literatura que fala do que está
a montante do amor,
mas não lhe está — eros, tanatos,
a sua ligação, o seu estar-entre-
estar
Mas tudo o que se sabe
repete-se em trajecto de sereia,
enigma de sereia
transmutada em cisne
Diz-se que só na morte
o cisne canta.
Mas é preciso organizar o vento
de forma a que o seu passo
seja mais que azul
Peço ao vento algum som,
alguma imagem
que seja tão brilhante e deslumbrada
como estas que aqui estão
à minha frente
Mas não responde o vento,
implausível que é o seu falar
A rota que traçaste permanece,
embora, e o corpo
reconhece-lhe o toque
desses dedos
Onde fica o que está descrito
em verso
no meio de tudo isto?
Onde se escondem as palavras
todas?
Sei que preciso de uma forma nova,
que precisava de palavra nova
para a moldura, ou cor
Era essa aprendizagem
de um olhar
que me faltava agora
— sobra somente o sol
iluminando o sítio onde é inútil
o mapa de viagem
Tudo o resto: inventado
há mais de três mil anos,
por entre templos, degraus onde, sentados:
discípulos de ausente obediência
Recorro ao alaúde,
— mas só o verso fala
e me responde
Traços rimados, círculos
em fogo, fragmentos com que inundam
as palavras já escritas
Colo nelas o selo deste mar
e sonho que são estas as palavras.
Nesta manhã de sol,
olho-as assim,
sabendo-as de algum tempo,
quase templos sagrados em que pinto
o dia a cores,
que nem herdadas de mil gerações
Numa tradição nula de viagem,
são o único ponto
a resistir
Tudo o resto: invenção
mais que plasmada,
multiplicados séculos
por cem
Mais de quatro mil anos
sobre o tempo novo,
e nada novo abaixo
deste sol
Talvez só este
abismo.
Interrompo no mapa
o precipício?
No traço dos teus dedos,
rota onde quase cabem: sereia,
o alaúde, o tempo,
nessa rota
— o suspendo
in A Génese do Amor, 2005