I am a contemporary of Villon
and at times I write to Montaigne,
who is shrewd but too absorbed
in the renowned, unstable wisdom
of his annotated books.
Yesterday, with Lady Nevell, I listened
to Byrd’s latest compositions
for the virginal which seemed to me
(especially the first pavian)
too excessive a bequest to posterity.
I write these lines now
then, face to face
with the sunset and the few clouds
that bedim, impudently,
the irremediable January sky.
In the meantime, rumour is rife that
Castile has taken over Portugal,
and there was an obscure poet
who chose to die beforehand
in verses of imponderable beauty.
I don’t know. The wine once again stains
my lips, the tired pilgrims of love,
and a greyhound comes slowly
to the hand that will never read José Saramago.
© Translated by Ana Hudson, 2010
Chronophobia
Sou contemporâneo de Villon
e escrevo às vezes a Montaigne,
arguto mas demasiado absorto
no renome e na sabedoria instável
dos seus livros anotados.
Ouvi ontem, junto de Lady Nevell,
as últimas composições de Byrd
para virginal e pareceram-me
(a primeira pavana, sobretudo)
uma dádiva excessiva à posteridade.
Escrevo estas linhas agora
outrora, olhando de frente
o crepúsculo e as poucas nuvens
que toldam, por desfaçatez,
o céu irremediável de Janeiro.
Corre entretanto o boato de que
Castela se apossou de Portugal
e houve até um poeta obscuro
que preferiu morrer antes disso,
em versos de imponderável beleza.
Não sei. O vinho cola-se-me uma vez mais
aos lábios, cansados peregrinos do amor,
e um galgo aproxima-se devagar
da mão que nunca lerá José Saramago.
in [SIC], 2002