we ride down the backs of hills inside
the earth eating eucalyptus eating haystacks
spitting out the wind spitting out time spitting out
time
time the trains gulp the opposite way going
the opposite way stealing our time my love
I need you who are flying
to me
but you fly unfurling sails over the sea
you have wing-space you hover you drift while I
keep crawling towards you along the rails
with occasional sparks I write to you my love
cheating your absence the claustrophobia of the mustard
coloured curtains you walk on water and now
I know
words are less worthy than boats
I need you my love in this loneliness this forsakenness
of thick curtains preventing the sun preventing my
flight and nevertheless on the opposite side
the sky boasts little lamb clouds hopping
hopping on oats and wheat fields there are none here
we eat eucalyptus eucalyptus and whitewashed churches
leaning over level-crossing whitewashed churches
my love
I smoke a cigarette in between two stops I read
Lobo Antunes I think people are sad people
are so sad people are pathetic my
love just as well you hide me from the world you hide
me from the world’s patronising smiles the world’s
self-righteous consent
by night on your loins my love I
am also a boat sitting on top of your body
I am a mast
I need you my love I am tired I ache
close to where my eyes are set I feel like crying still I
desire you but before before you touch me before you say
I want you my love you shall let me sleep a hundred years
a hundred years from today we’ll be boats again
I am lonely
Portugal is everlasting we eat eucalyptus
everlasting eucalyptus lean and green
we eat eucalyptus interspersed with shrubs
we eat eucalyptus the ache of your absence my love
we eat this heat and the railtracks and anguish
set ablaze inside Lobo Antunes’ novel
we eat eucalyptus and Portugal is everlasting Portugal
is huge and I need you and in the opposite way they are stealing
time it’s our time they are stealing my love it’s time
time for us to be boats and sail through walls inside rooms
my love to be boats at night
at night to blow oh sweetly blow into full sail
boats.
© Translation by Margarida Vale de Gato and Ana Hudson, 2010
Intercidades
galopamos pelas costas dos montes no interior
da terra a comer eucaliptos a comer os entulhos de feno
a cuspir o vento a cuspir o tempo a cuspir
o tempo
o tempo que os comboios do sentido contrário engolem
do sentido contrário roubam-nos o tempo meu amor
preciso de ti que vens voando
até mim
mas voas à vela sobre o mar
e tens espaço asas por isso vogas à deriva enquanto eu
vou rastejando ao teu encontro sobre os carris faiscando
ocasionalmente e escrevo para ti meu amor
a enganar a tua ausência a claustrofobia de cortinas
cor de mostarda tu caminhas sobre a água e agora
eu sei
as palavras valem menos do que os barcos
preciso de ti meu amor nesta solidão neste desamparo
de cortinas espessas que impedem o sol que me impedem
de voar e ainda assim do outro lado
o céu exibe nuvens pequeninas carneirinhos a trotar
a trotar sobre searas de aveia e trigais aqui não há
comemos eucaliptos eucaliptos e igrejas caiadas
debruçadas sobre os apeadeiros igrejas caiadas
meu amor
eu fumo um cigarro entre duas paragens leio
o Lobo Antunes e penso as pessoas são tristes as
as pessoas são tão tristes as pessoas são patéticas meu
amor ainda bem que tu me escondes do mundo me escondes
dos sorrisos condescendentes do mundo da comiseração
do mundo
à noite no teu corpo meu amor eu
também sou um barco sentada sobre o teu ventre
sou um mastro
preciso de ti meu amor estou cansada dói-me
em volta dos olhos tenho vontade de chorar mesmo assim
desejo-te mas antes antes de me tocares de dizeres quero-te
meu amor hás-de deixar-me dormir cem anos
depois de cem anos voltaremos a ser barcos
eu estou só
Portugal nunca mais acaba comemos eucaliptos
eucaliptos intermináveis longos e verdes
comemos eucaliptos entremeados de arbustos
comemos eucaliptos a dor da tua ausência meu amor
comemos este calor e os caminhos de ferro e a angústia
a deflagrar combustão no livro do Lobo Antunes
comemos eucaliptos e Portugal nunca mais acaba Portugal
é enorme eu preciso de ti e em sentido contrário roubam-nos
o tempo roubam-nos o tempo meu amor tempo
o tempo para sermos barcos e atravessar paredes dentro dos quartos
meu amor para sermos barcos à noite
à noite a soprar docemente sobre as velas acesas
barcos.
in Mulher ao Mar, 2010