It’s more than sure: I don’t miss you.
I spent the whole afternoon tiding up your papers,
reading again the five letters you managed to send
during the week that was wasted: you in the Alentejo,
and I under water. Then I watered the roses
you left in the garden. Always by myself and
not moaning about my lot (since I don’t miss you),
I put on the Chavela record you gave me for Christmas
and started to cook your favourite dish.
Cooking made me lose my appetite; and so
I opened a bottle of red and it’s not hard
to confess that I don’t miss you.
Around 10 pm, I made myself refuse
two invitations to go out (I gave androphobia as an excuse)
and right now I’m cutting out your image
(I don’t miss you) from the photos I own of both of us
in order to punish with the paper basket
the awkward idiot who let you go.
© Translated by Ana Hudson, 2011
Penélope escreve
É mais que certo: não sinto a tua falta.
Fiquei a tarde toda a arrumar os teus papéis,
a reler as cinco cartas que me foste endereçando
na semana que perdemos: tu no Alentejo,
eu debaixo de água. Fui depois regar as rosas
que deixaste no quintal. Sempre só e sem
carpir o meu estado (porque não me fazes falta),
pus o disco da Chavela que me deste no Natal
e comecei a preparar o teu prato preferido.
Cozinhar fez-me perder o apetite; por isso
abri uma garrafa de maduro e não me custa
confessar-te que não sinto a tua falta.
Por volta das dez horas, obriguei-me a recusar
dois convites pra sair (aleguei androfobia)
e estou neste momento a recortar a tua imagem
(não me fazes falta) nas fotos que possuo de nós dois,
de maneira a castigar com o cesto dos papéis
a inábil idiota que deixou que tu te fosses.
in Ulisses já não mora aqui, 2002