In the shop window one reads Rare
and Second Hand Books underneath
the awning’s tilted blue – right opposite
stands the frosty franchise coffeeshop
where days mistreat desire
and smoking is not allowed. I climb
up to the small cubby-holes
dunked in the sweet staleness
of literature and run my eyes from A
to Z along the slender, chipped

spines of poetry. This is the
emptiest space of November
and that which most comforts me;
the book I choose for fifty
pence has on the first page
a name and an address: Shirley Ann
Eales, of Scottsville – a faint
autograph with long, triangular
capitals in which imagination
finds for a moment enough

pretext and oxygen to burn.
This book had another life,
belonged in another house, on another
bedside table – and the thought,
because so obvious, summons
a sudden dizziness, an abrupt tunnel
into the world’s immenseness
where chance is touted. Ah, we know
life is improbable when we find
ourselves musing, one insipid

mid-afternoon, on an unknown woman
who read poems in Scottsville in the
70’s. But might there be in this some sort
of meaning, some sign kept for
someone wiser or more innocent
than me? I don’t know who
or where you are, Shirley Ann,
but how beautiful it would be if
one day, thanks to this same chance,
you came across your name in these verses.

© Translated by Ana Hudson, 2011

 

Shirley Ann Eales

Na vitrina lê-se Livros Raros
e Usados sob o azul inclinado
de um toldo – mesmo em frente
à glacial cafetaria de franchise
onde o dia destrata o desejo
e não se pode fumar. Subo
aos pequenos gabinetes
mergulhados no doce bafio
da literatura e percorro de A
a Z as espinhas estreitas

e rachadas da poesia. É o sítio
mais vazio de Novembro
e o que mais me reconforta;
o livro que escolho, por metade
de uma libra, traz no frontispício
um nome e uma morada: Shirley Ann
Eales, de Scottsville – um sumido
autógrafo de maiúsculas magras
e triangulares onde a imaginação
encontra por enquanto pretexto

e oxigénio suficientes para arder.
O livro teve outra existência,
pertenceu a outra casa, a outra mesa
de cabeceira – e o pensamento,
de tão óbvio, conjura de repente
uma vertigem, é um corredor
abrupto para a imensidão do mundo
onde trafica o acaso. Ah, sabemos
que a vida é improvável se damos
por nós a cismar, a meio de uma tarde

insípida, numa mulher desconhecida
que lia poemas em Scottsville, nos anos
70. Mas haverá aqui alguma espécie
de sentido, algum sinal guardado
para alguém mais sábio ou inocente
do que eu? Não sei quem és
nem onde estás agora, Shirley Ann,
mas como seria belo se pudesses
um dia encontrar, por obra da mesma
sorte, o teu nome nestes versos.

in Longe da Aldeia, 2005