What is poetry for, my friend? It’s for us to inhabit
and where we are handed warnings and summonses
and go down the stairs
a sniffed key in our hand.
Rain or no rain
to open a box
we need five steps without history.

Let there be a bank statement
junk mail
even a proper bill,
But as a surprise
or (let it be praised)
as a distracted expectation
we’ll surely find there
the mystery envelope.

No matter how often it’s opened,
it will never unveil
nearly all about love.
It will be opened by another sniffed key
rain or no rain
drops will cover our hands
(expecting, of course, not to know for today
what will covertly be declared
about what poetry is for).

© Translated by Ana Hudson, 2010

 

Para que serve

Para que serve a poesia, minha amiga? serve de morada
é lá que recebemos os avisos e as convocatórias
e descemos as escadas
de chave farejada na mão.
Chova e não chova
para abrir uma caixa
são precisos cinco passos sem história.

Haja o extracto de conta
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e mesmo uma conta, a sério.
Mas por surpresa
ou (honra lhe seja feita)
distracção da expectativa
aí há-de jazer
o envelope mistério.

Aquele que por mais vezes que o abramos
não desvenda nunca
quase tudo do amor.
Com outra chave farejada o abrimos
chova ou não chova
as mãos enchem-se de gotas
(esperando, sim, não saber, por hoje,
o que de lá se declara dos ocultos,
para que serve a poesia).

in O sangue por um fio, 2009